Esse Não é o Seu Final Feliz

 

POV Justin

 

Chuck e Alice adormeceram em meu colo e meu desespero me consumia. O que eu havia feito? Por que me tornei esse monstro? Por que eu estava indo contra meus princípios? Por que tudo que eu fazia agora condizia as com as coisas que eu nunca quis fazer? Como deixei minha vida chegar nesse extremo? Lúcio mais uma vez queria minha cabeça quando eu pensei que já havia contornado minha situação com ele, Alana estava vida – por enquanto – mas estava viva. Um dos meus melhores amigos havia tentado me matar e agora a minha própria mulher estava contra mim para poder defendê-lo. Deixei meu impulso me controlar e acabei fazendo merda. Agora eu estava feito um fraco, voltando à estaca zero, procurando por drogas toda vez que sentia o mundo desabar ao meu redor, quando eu não podia controlar mais nada do que acontecia em minha vida. Chuck e Alice só agravavam a minha preocupação. Só queria pegar eles e Lorena e sumir para sempre. Viver pra sempre enfurnado numa ilha deserta, mas creio que até lá Lúcio me encontraria. Merda de vida! É exatamente nessa hora que você percebe como as escolhas que você faz no passado afetam seu presente, é nessa hora que você percebe o quanto você era o imaturo. O que eu estava pensando quando comecei a trabalhar pro Lúcio? Tudo começou dar errado a partir daí. Aliás tudo começou a dar errado quando tentei sair disso, mas como Kimberly sempre diz e volta a repetir: Quem entra nisso, nunca sai. As vezes eu sabia que ela só falava pra me importunar, mas não deixava de ser uma verdade. Ou eu me rendia, ou eu viveria me escondendo e matando pessoas que estão tentando me matar. Eu seria pra sempre uma mosca presa na teia do Lúcio e ele era uma aranha faminta doida para me devorar. De tiros.

Levantei do sofá com um pouco de dificuldade, já estava muito tempo ali. Não conseguia tira-los dos meus braços por causa daquela sensação de que nunca mais os veria. Coloquei um em cada berço e eles dormiam profundamente.


Chuck.


Eu estava tenso, triste e muito puto comigo mesmo. Saí do quarto chamando pelas babás que surgiram no corredor um pouco receosas.


– Olhem eles, estou saindo. – falei mandão e elas assentiram sem me encarar nos olhos.


O Justin que todos tinham medo estava de volta. Sorri fraco sem expressão alguma enquanto descia a escada. Odiava essa sensação de todos me temerem, odiava me sentir um monstro. Eu não era isso, minha vida não era essa. Simplesmente me afoguei numa piscina de desilusões e hoje eu era só o que a vida me impôs ser. Mas esse não era eu, de jeito nenhum. Atrás do monstro existe apenas um pai tentando manter seus filhos vivos e um cara que não consegue sentir que está perdendo a mulher da sua vida. Sim, ciumento, nunca disse que não. Impulsivo? Prazer, meu sobrenome. Mas apenas odiava Lorena me desmoralizando. Seu querido Chaz havia tentado me matar, e isso soava tão ensurdecedor pra mim, não entendia porque não para ela. Entrei no carro e me sentia um covarde. Fiquei parado um instante com as mãos no volante. Com que cara eu iria olhar pra eles? Engoli a seco ligando o carro. Foda-se meu orgulho, eu tinha que saber como Lorena estava.


POV Ryan

 

Uma hora havia se passado e estávamos todos na sala de espera esperando algum filho da puta de um médico tomar vergonha na cara e vir dizer alguma coisa. Estranhava a calma do Jeremy, mas eu o conhecia desde pequeno, sabia que quando ele tivesse tempo, cabeça e disposição ele acabaria com o Justin com as próprias mãos. Pattie estava preocupada andando de um lado para o outro a procura de informação. Fernanda estava sentada em uma das cadeiras e tinha o olhar perdido no chão.


– Temos que avisar à Sônia. – disse Pattie firme.

– Não, não temos. – disse Jeremy num tom um pouco irritado.

– Ela é a mãe da Lorena, ela precisa saber o que está se passando com a filha! – disse petulante.

– Não, ela não precisa. – disse Jeremy tentando manter a calma.

– Posso saber por que você está defendendo tanto o seu filho? Ele errou! – disse Pattie furiosa cruzando os braços.

– Lorena está bem, está respirando, só está desacordada. Nada demais aconteceu. Se você for explanar isso que o Justin fez, espero que você tenha a consciência de que vão levantar outras mil coisas que ele fez. – falou rude e Pattie bufou.

– Ele não pode simplesmente fazer isso e ficarmos aqui aplaudindo. – disse já com seus olhos marejados. Era perceptível o quanto ela estava destruída por ter que ficar contra o filho, mas namoral, o Justin merecia.

– Eu vou resolver isso com ele. Apenas eu. – disse de forma tranquila, mas não me deixei enganar.


Houve um silêncio e Pattie apenas bufou não dizendo mais nada. Jeremy sempre foi um causador de problemas. Pelas histórias que Justin me contava, os pais da Pattie não gostavam nem um pouco dele. Ele aparentava ser calmo, mas sei que uma vez tentou bater na Pattie e por isso se separaram. Sei de alguns casos que ele está envolvido como furtos, roubo e mortes, mas nunca perguntei nada a Justin porque sabia como ele odiava esse lado de seu pai. Só que, ironicamente, ele havia se tornado tudo que o pai é.


– Lorena vai se recuperar, eu sei disso. Chegamos a tempo. – disse Jeremy um pouco despreocupado.

– Paciente Lorena. – gritou uma enfermeira olhando uma prancheta e voltou seus olhos para todos da sala como se procurasse os responsáveis pela paciente.


Fomos em sua direção rapidamente e ela sorriu fraco.


– Somos nós. – disse Pattie apreensiva.

– A Lorena está se recuperando bem. O cérebro dela ficou alguns segundos sem oxigênio, mas nada que deixe sequelas. Os primeiros-socorros foram muito importantes. De quem foi os procedimentos? – perguntou curiosa.

– Meus. – respondi fraco e ela sorriu.

– Ela está fraca, mas o soro está dando todo o suporte que ela precisa pra reagir bem. As marcas em seu pescoço não são de corda. Por favor, eu aconselho que vocês deem parte na polícia para que vocês procurem saber o que de fato ocorreu com ela. Segundo o – olhou de volta pra prancheta. – Sr. Jeremy, ela é suicida. Bom, isso é muito sério. Ela tem depressão? Precisamos anotar tudo, temos que encaminhar ela pra uma boa reabilitação caso isso volta acontecer.

– Ela fica mal alguns dias do mês. Depois da gravidez que isso ocorreu. – disse Jeremy se apressando em responder. Cara, ele merecia um prêmio por ser tão convincente.

– Ah, isso explica tudo. Depressão pós-parto não é uma coisa rara. Insisto que vocês então procurem um psicólogo, ele poderá ajudar a paciente.

– Já podemos vê-la? – perguntei apreensivo.

– Sim. – ela sorriu. – Só não demorem muito, ela precisa descansar. Mas creio que amanhã de manhã ela já terá alta. Não ocorreu nada muito grave, não. – disse carinhosa.


Caminhamos atrás dela até ela nos levar a uma porta que ficava no fim do corredor do terceiro andar. Minhas mãos suavam, mas eu estava muito mais aliviado. Minha raiva estava mais aparente agora sabendo que Lorena estava bem, podia voltar a pensar em acabar com a raça do filho da puta do Justin. Ele merecia muito mais que um soco.




POV Lorena

 

Minha cabeça doía um pouco, mas me sentia disposta para ir embora, apesar da médica me dar bronca dizendo que apenas poderia ir embora ao dia seguinte. Estava sozinha no quarto encarando as gotas do soro que desciam vagarosamente do saquinho. Meu coração estava em mil pedaços. Sentia raiva, sentia tristeza e principalmente vergonha. A imagem do Justin em cima de mim me enforcando vinham a tona. Eu fechava os olhos com força como se pudesse me livrar delas, mas a única coisa que acontecia eram minhas lágrimas que escorriam muito mais quando eu pressionava as pálpebras. Meu coração acelerava e uma dor percorria por todo o meu corpo. Ele feriu meu coração, mas todo os lugares do meu corpo doíam. Como ele foi capaz disso? Pior ainda, como ele foi capaz disso no dia do nosso noivado? Cada segundo mais me arrependia de ter voltado pra ele. Como sempre digo, ele estava apenas sendo ele. Aquele papo de não gostar de matar, de não ser um monstro, de me amar e blá blá blá... Por que acreditei nisso tudo? Me sentia uma idiota! Qualquer criança saberia que ele apenas estava tentando me convencer com aqueles olhos perfeitos e suas palavras tão mentirosas. Ele havia tentado me matar e esse Justin me assustava. Não, não! Meus filhos não poderiam crescer com esse monstro como pai. Eu nunca mais perdoaria o Justin. Chega! Eu tenho meu valor, ou um dia eu tive. Mas, chega. Escutei duas batidas na porta e de repente Ryan colocou a cabeça pra dentro e finalmente eu estava vendo alguém conhecido.


– Oi. – ele disse fraco entrando no quarto e fechando a porta.

– Por favor, me tira daqui. Eu preciso dos meus filhos, eu preciso tirar de perto do Justin. Eu preciso sair daquela casa, por favor. – falei desesperada sentando na cama e tentando arrancar aquela agulha.



As mãos do Ryan tocaram minha mão calmamente impedindo-as de arrancar a agulho.


– Fica calma. – falou docemente, mas eu podia ver a tristeza em seus olhos.

– Por favor, Ryan! Meus filhos estão lá sozinhos e...

– Sh... Sei que o Justin extrapolou com você, mas ele jamais machucaria aquelas crianças. – disse calmo.

– Não sei... – falei sentindo as lágrimas me dominarem. – Ryan, o que eu fiz pra merecer isso, me diz?


Ele bufou alto negando com a cabeça.


– Nada. Você não é a errada da história. – falou colocando uma mão em minha bochecha.

– Eu quero ir embora, não quero mais ficar lá. – falei chorosa.

– E pra onde você vai? – perguntou cruzando os braços já sabendo que mais uma vez na minha vida eu não tinha essa resposta.

– Ryan, eu quero ser feliz ao lado da pessoa que eu amo. Eu tenho dois filhos lindos, o Justin parecia que tinha mudado. Aquele Justin que eu conhecia do colégio não tinha nada a ver com o Justin que ele era quando estávamos a sós, eu pensei que finalmente o meu final feliz havia chegado e... – falei chorando e no final abaixei a cabeça derrotada.Os dedos frios de Ryan tocaram meu queixo levantando minha cabeça para que eu pudesse o olhar.


– Você está feliz? – perguntou meio óbvio.

–Pareço feliz?

– Então esse não é o seu final feliz ainda. – disse sorrindo.


O abracei de forma demorada. O que seria de mim desde o começo de tudo se o Ryan não estivesse ao meu lado me protegendo?



POV Justin

 

Estacionei o carro de qualquer jeito na vaga e corri até o hospital abrindo a porta de vidro com força. Andei com passos largos até a recepção.



– Pois não? – disse um pouco oferecida.

– Paciente Lorena. – falei seco sem precisar falar o sobrenome. Acho que todos ali já conheciam a gente.


A recepcionista checou algo rapidamente em seu computador e voltou a me olhar.


– Quarto B, 3° andar. – disse sorrindo.


Assenti com a cabeça agradecendo e segui o corredor até chegar ao elevador. Apertei os botões freneticamente e logo ele desceu se abrindo. Entrei no elevador e, sem muitas demoras, já estava no 3° andar. Avistei meus pais e Fernanda no final do corredor, certamente ali era o quarto de Lorena. Minha mãe me olhou assustada, acho que não esperava que eu tivesse a coragem de aparecer lá. Os olhos dos meus pais se cruzaram com os meus e ele praticamente voou em minha direção. Parei de andar quando ele chegou bem próximo.


– Vá pra casa. – ordenou firme com os dentes trincados.

– Vim ver a minha mulher. – encarando seus olhos com ira.

– A mulher que você tentou matar? – perguntou furioso.

– Isso é entre mim e ela, você não tem que se meter. Nem você nem ninguém!– falei cuspindo as palavras tentando moderar o tom de voz.

– Se não tivéssemos nos metido, talvez ela estivesse morta agora. – falou fechando um punho.

– Você não sabe metade da história, então, não se meta. – falei as últimas palavras calmamente, mas firme.

– O que não sei? Que meu filho é um bandidinho? Um drogado? Infelizmente eu sei. – disse cuspindo as palavras falando com autoridade.

– E quem é você pra falar algo de mim? Pelo menos não abandonei minha filha! – falei sentindo o ódio me possuir, mas moderei o tom de voz mais uma vez, não queria mais problemas para mim.


Meu pai me olhou com ira, mas no fundo sua expressão era de tristeza. Retribuí o olhar na mesma intensidade e vi minha mãe se aproximando.


– Jeremy. – falou com sua voz fina enquanto tocava o braço do meu pai. –Aqui não é lugar disso.


Eu e meu pai ainda nos encarávamos como dois leões brigando por uma presa. Sentí meu celular vibrar em meu bolso e virei em direção contrária do meu pai pegando o celular. Minha mãe tentava puxar meu pai e com certeza eles começariam uma briga.


– Alô. – atendi impaciente sem ao menos olhar o visor pra ver quem era.

– Justin. – a voz da pessoa saiu em meio a um suspiro fraco. Presumi que estivesse chorando.

– Kimberly? – perguntei confuso.

– Preciso de você. – disse chorosa.

– O que houve? – perguntei já perdendo a paciência de uma forma preocupada.

– Por favor, apenas venha nesse endereço que vou mandar por mensagem, por favor. – falou fraco e a ligação foi desligada.


Encarei o nada. Tinha que ver Lorena, mas Kimberly havia me assustado. Olhei para trás e meu pai já havia voltado pra onde estava e minha mãe também.


– Mãe. – gritei no corredor com a voz grossa e ela me olhou vindo em minha direção. – Como Lorena está? – perguntei impaciente.

– Ela está bem, mas... – começou a dizer e então a cortei.

– Então depois eu volto. – falei virando as costas deixando ela sem entender nada.


Não quis esperar o elevador, então desci as escadas correndo.


POV Kimberly

 

3 da madrugada, me sentia um caco. Nenhuma notícia, nenhuma resposta. Estava sentada num banco então apenas tombei a cabeça pra trás a encostando na parede tentando vetar aquele cheiro de hospital do meu nariz. Tudo tinha que dar certo, pelo menos agora na minha vida. Eu não poderia perdê-la de jeito nenhum. Já havia feito meus exames e torcia para que eu fosse compatível, pois não tinha mais a quem recorrer. Alguns minutos se passaram e minha angústia aumentava. Me sentia exausta, não pregava os olhos a uns dois dias.


– Sr Kimberly? – ouvi uma voz grossa e abri os olhos vendo o médico na minha frente.


Me levantei rapidamente arrumando a roupa e me aproximei dele. Sua cara não indicava uma notícia boa. Merda.


– Desculpe, mas a senhora não é compatível. Vamos ter que esperar para que surja um doador. – falou de força calma.

– Esperar? Não dá pra esperar. – falei desesperada.

– É a única coisa que podemos fazer. O câncer já está num grau muito alto, infelizmente foi descoberto um pouco tarde, mas faremos um possível. – falou colocando as mãos em meu ombro e eu encarei o nada.


Senti suas mãos abandonarem meu corpo e ele se virou indo embora. Filho da puta! Estava tão acostumado a dar notícias ruins que nem ao menos podia imaginar o quanto aquilo era demais para mim. As lágrimas escorriam e sentia meu corpo tombar. Ela era tudo que eu tinha nessa vida. Era um pesadelo, tinha que ser e eu tinha que acordar o mais breve possível. Cambaleei de volta pro banco. Passei a mão do rosto até o cabelo. O que eu poderia fazer? JUSTIN! Meu pensamento gritou. Não, ele não. Sim, ele sim. Não, ele não. Não posso, não devo. Por quê? Por que isso agora? Merda de vida, me leve! Me leve no lugar dela, mas não me leve ela. Peguei o celular e havia um choro preso na minha garganta, se eu o soltasse certamente soluçaria alto. Apertei seu nome e esperei chamar já complemente sem chão. Era minha única saída, era o único jeito.


– Alô. – sua voz soou um pouco impaciente. Estava de madrugada, talvez eu tivesse o acordado.

– Justin. – falei um pouco falho tentando compassar a respiração.

– Kimberly?

– Preciso de você. – falei sendo dominada pelo choro.

– O que houve?

– Por favor, apenas venha nesse endereço que vou mandar por mensagem, por favor. – foi tudo que aguentei falar e então desliguei fechando os olhos com força.


Escrevi a mensagem errando quase tudo pois as lágrimas não me deixavam ver. Enviei assim mesmo, ele entenderia. Marquei de encontrar com ele numa rua, próxima. Ainda estava receosa de não conseguir contar tudo para ele e não queria que ele soubesse que eu estava num hospital. Saí do hospital indo em direção a rua que estava vazia. Sentei em um ponto de ônibus e depois de uns 20 minutos o farol do seu carro iluminou a rua. Justin parou o carro assim que me viu e abriu a porta rapidamente.



Sua testa estava franzida, podia prever que estava preocupado, mas também estava irritado. Tudo que eu menos queria agora era pedir sua ajuda, mas ele seria o único que poderia me ajudar.



– O que foi? – perguntou confuso chegando perto de mim.



Meu coração acelerou, minha voz ficou presa. Prometi pra mim mesma que ninguém nunca saberia daquilo. Eu apenas tinha que tomar coragem. Respirei fundo fechando os olhos e toda minha armadura de orgulho caiu ao chão.


– Kimberly. – sua voz saiu alta e seus braços seguraram com força os meus me sacudindo como se quisesse que eu acordasse. – O que aconteceu? Fala logo! – disse impaciente.


Abri meus olhos e encarei os seus. As lágrimas estavam em minhas bochechas molhadas. Simplesmente minha voz não saía. Não tinha forças pra fazer aquilo, não tinha forças pra dizer aquilo.

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